A Netflix não perdeu tempo e logo no primeiro dia do ano presenteou os fãs de Cobra Kai. Afinal, foi a data de estreia da terceira temporada da série. A ansiedade por saber o destino de LaRusso, Lawrence e seus alunos era tanta, que a continuação de Karatê Kid rapidamente alcançou o primeiro lugar na plataforma de streaming. A série caiu no gosto do público, pois surfa na nostalgia dos anos 80, temperada com muitos dramas adolescentes. Dessa forma, é uma mistura equilibrada de passado e futuro. Além disso, possui um enredo que brinca consigo mesmo e os próprios clichês.
A expectativa sobre a terceira temporada estava alta. Isso se devia tanto aos acontecimentos que finalizaram a temporada anterior, quanto à mudança de mãos dos direitos da série. A saber, a história foi produzida originalmente pelo YouTube Red, atual YouTube Premium e agora passou para as mãos da Netflix. Dessa forma, Cobra Kai veio ainda mais empenhada em trabalhar com a nostalgia, trazendo de volta personagens como Kumiko e Ali Mills. Além disso, mantém a proposta de não se prender tanto a ideia de mocinho e vilão, tentando humanizar à medida do possível todos os personagens.
Se por um lado Cobra Kai estreitou a relação do público com os personagens, por outro deixou um impressão de que os eventos que aconteceram em 10 capítulos caberiam em 6. Ainda assim, a terceira temporada trouxe momentos muito marcantes. Afinal, a dinâmica entre LaRusso e e Lawrence funciona muito bem, apesar de ter mudado um pouco. A participação de Ali Mills acrescentou muito a essa dinâmica e foi um dos pontos altos da série.
E os adolescentes?
A terceira temporada da série trouxe bastante foco no núcleo adolescente. Porém, algumas histórias deveriam ter sido melhor desenvolvidas. Falcão/Eli, por exemplo, teve um grande destaque, chegou ao ápice, protagonizando as cenas mais violentas da temporada, inclusibe quebrou o braço de Demitri. Ao mesmo tempo, sua crise de identidade merecia um foco maior. E por falar em Demitri, a participação dele foi bem divertida para equilibrar com comportamento extremo de seu ex-amigo.
A história de Tory também teve mais foco no começo da temporada. Entretanto, as dificuldades que a jovem passa não foram suficientes para justificar seu comportamento violento. O público não conseguiu desenvolver uma empatia e ela continua sendo vista como antagonista. Miguel e Samantha mantiveram seu destaque na série, enquanto Robby perdeu espaço.
LaRusso, sensei do Miyagi Do
Embora existam teorias de que Daniel LaRusso na verdade é o vilão de Karatê Kid, em Cobra Kai ele é um cara perdido tentando fazer o certo, mas com aquele ar de superioridade. Para isso, ele conta com a nostalgia, revisitando sempre os conselhos de seu sensei Miyagi. Essa relação com o passado e seu antigo mestre foi bastante explorada na terceira temporada, principalmente por conta da visita a Okinawa e o reencontro com pessoas importantes em seu passado. Posteriormente, as novas lições foram passadas para Samantha, que recebeu a ajuda de seu pai para superar um estresse pós-traumático (sem terapia, óbvio)
LaRusso continua enrolado para equilibrar família, concessionária e caratê. Entretanto, tem a sorte de contar com um dos melhores personagens da série: Amanda. A senhora LaRusso tem muita personalidade e uma visão de mundo bem mais sensata do que a de seu esposo turrão.
Lawrence, sensei dos Presas de Águia
A relação de Lawrence com o passado, em especial com os anos 80 é bem diferente da construída por LaRusso. Johnny parou no tempo, não acompanhou a evolução de nada e protagoniza as cenas mais hilárias da temporada. Ele é o principal responsável por “tirar sarro da nostalgia”, uma vez que mostra que definitivamente algumas coisas não caberiam hoje.
Certamente, um dos detalhes mais envolventes de Cobra Kai é a relação entre Miguel Diaz e Johnny Lawrence. O sensei é homem das antigas em processo de desconstrução. Vindo de uma criação ríspida, com marcas de um relacionamento abusivo com seu professor, entende a virilidade como a maior virtude. Portanto, para ele o mais importante é se manter forte diante das adversidades. Por outro lado, Diaz traz a leveza e a sensibilidade para vida de Lawrence, enquanto aprende a ser forte com seu professor. Assim, eles se equilibram e constroem um enredo super convincente. Johnny ajuda Miguel com a “fisioterapia”, Miguel ajuda ajuda Johnny com as redes sociais.
No entanto, o foco na relação entre Diaz e seu sensei tem um preço no enredo. Robby Keene, o filho de Lawrence foi deixado de lado. O personagem de Tanner Buchanan, inclusive, chegou a ficar dois capítulos seguidos sem sequer aparecer. Além disso, a fórmula que seguiu foi exatamente igual às temporadas anteriores. Lawrence furou com o filho por ter priorizado Miguel, Robby revoltado se aliou ao inimigo de seu pai. A diferença é que antes foi Daniel LaRusso e agora foi John Kreese.
Kreese, sensei do Cobra Kai
Como dito, Cobra Kai está o tempo todo trabalhando a ideia de que qualquer pessoa faz coisas boas e ruins e que por detrás de comportamentos existem histórias. A saber, nem o malvadão John Kreese foge à regra. Ao contrário, o jovem Kreese era bondoso e honesto antes de ser embrutecido pelos horrores da Guerra do Vietnã. A partir desse fato, ele passou a aplicar as lógicas de combate em absolutamente todos os âmbitos da vida.
De tal forma, ele não treina alunos para competições, treina para batalhas e em batalhas a única regra é sobreviver. Ou seja, Kreese é notoriamente um caso de estresse pós-traumático decorrente de Guerra. Mas terapia passou longe de ser uma opção e o governo também não cuida lá muito bem de seus ex-combatentes (só que essa parte definitivamente não vai ser mencionada em Cobra Kai). Para ele, não há bons ou maus, há o inimigo e o aliado. Um padeiro de um país enfrenta um marceneiro de outro, não porque um é bom e o outro mal, mas porque estão em lados opostos da guerra e naquele momento são inimigos. E só um vai sobreviver.
Entretanto, revisitar o passado de Kreese acaba não sendo muito necessário ao desenrolar da trama. Sempre foi evidente que ele aplica lógica de guerra em seu dojô. Além disso, saber que um dia ele foi diferente não diminui a responsabilidade por alimentar um ciclo de violência entre adolescentes, ressaltando neles a capacidade de trair, trapacear e “vencer” a qualquer custo. E não dá pra negar a força de Kreese como vilão.
O veredito sobre a série
Cobra Kai é uma série envolvente e divertida e seus furos não são suficientes para enfraquecer o vínculo entre os personagens e o público. Não adianta esperar roteiros muito realistas. Curas milagrosas e coincidências improváveis fazem parte dessa grande brincadeira temperada pelo politicamente incorreto proposital. Inclusive, a dublagem ameniza, substituindo algumas expressões (o que não é necessariamente útil, pois a ideia é justamente mostrar o quanto Johnny é antiquado e que alguns comportamentos não cabem mais hoje).
Alguns personagens deveriam ser melhor aproveitados e a série teve uns problemas de ritmo em alguns capítulos, mas recobrou o fôlego e os capítulos finais tiveram uma excelente dinâmica. Em resumo, continua sendo uma excelente série de entretenimento, da qual não se espera grandes reflexões, mas muita identificação, nostalgia e risadas. A conclusão é que continua valendo à pena assistir.
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