O Paço Imperial apresenta, a partir do dia 5 de julho, a exposição Fio-ação, da artista visual e pesquisadora fluminense Mariana Guimarães. Com curadoria de Izabela Pucu, a individual vai ocupar o Terreiro do Paço com cerca de 300 obras da produção recente da artista, além de um pequeno conjunto desenvolvido nos últimos 10 anos. Mariana tem o fio, o bordar e o tecer como elementos condutores de sua poética. O projeto inclui, ainda, um ciclo de encontros.

Reunindo diversos trabalhos inéditos, entre eles uma instalação que percorre todo o espaço expositivo, a mostra está organizada em três grandes núcleos relacionados. A seleção curatorial inclui objetos, bordados, intervenções, fotografias, vídeo-performance e obras bidimensionais – de pequenos e grandes formatos – feitas em tecido e papel, cujo ponto de partida é pensar o fio desde os gestos iniciais, os fluxos e os movimentos dos nascimentos.
A divisão dos núcleos é determinada por interesses recorrentes de Mariana – brotação, casa, maternidade, sertão – apresentando muitas zonas de contato entre eles. Os processos e a narrativa da mostra foram construídos a partir da observação de sementes germinando, do diálogo com a floresta e do atravessamento da maternidade no corpo da artista.
“Ao longo dos últimos 20 anos, venho me dedicando a investigar o fio como linguagem e como dispositivo de mediação e invenção na arte contemporânea. Ele é a possibilidade de reinvenção de novos mundos, de construção de diálogos e conexões.
De acordo com Izabela Pucu, “o fio na produção artística e teórica de Mariana é instrumento de reconhecimento de valores e saberes implicados em outros modos de vida, de desfazimento das narrativas que servem à manutenção das hierarquias que inscreveram o feminino em um lugar estereotipado no ambiente doméstico-social opressor. Nesse sentido, podemos dizer que há uma dimensão trágica latente nos papéis e tecidos de Mariana, que vem desse exercício de elaborar, por meio do trabalho, a condição de ser mulher-mãe-artista no mundo”.
No diálogo com Rosa, primeira filha da artista, a questão da maternidade entra conceitual e materialmente no trabalho de Mariana, desde os primeiros momentos da inscrição da menina na linguagem, até a escrita e os desenhos mais elaborados. Nessa relação, os limites da casa e da maternidade são experimentados em toda a sua ambiguidade – como espaço político de acolhimento e intimidade, de conflito e aprendizado, de opressão e gozo, com interditos e potências.
Dos deslocamentos de pesquisa no sertão mineiro e nas cidades do Nordeste, surgem muitos elementos conceituais e construtivos para esta exposição, como o hábito de cultivar plantas nos potinhos descartáveis, a lenda da cobra que mama, além de fios e tecidos naturais, fiados e tingidos de forma artesanal. Sobretudo, aparecem outras mulheres com suas histórias e saberes, em relações que falam do fio enquanto “instrumento de mediação e de diálogo”, como diz a artista.
A dinâmica evocada pela ideia
de fio-ação tem sua imagem mais icônica na instalação que atravessa o
espaço expositivo com fios que, num jogo com a gravidade, suspendem e
fazem ceder estufas, trouxas, terra, pedaços de linho, caquinhos de
azulejos, palavras, plantas e aglomerados de signos do trabalho da
artista. O público é incluído nesse sistema ao pisar as pedras de lioz
do Terreiro do Paço, ocupado pela mostra: no deslocamento, com ritmo
marcado pelas obras de Mariana, outras memórias se insurgem desde o
chão, como os caquinhos de azulejos coletados todos os dias pela artista
em suas andanças.