A sensação de déjà vu toma conta das salas de cinema. Sequências, remakes e prequels dominam a cena, enquanto a originalidade parece ter se tornado um bem raro em Hollywood. Será que a indústria cinematográfica perdeu sua criatividade nas últimas duas décadas ou o público se tornou mais exigente, ou até mesmo “chato”? Nesta série de artigos, embarcaremos em uma jornada para desvendar esse mistério e entender o que está acontecendo com o cinema.
Para se ter uma ideia, entre 1999 e 2003 tivemos: Matrix, O Senhor dos Anéis, Clube da Luta, Piratas do Caribe, em outras palavras, diversos blockbusters de peso em um curto espaço de tempo. Logo, o propósito desta série de artigos será tentar entender o que aconteceu com a indústria do cinema nas últimas duas décadas. Teria o cinema ficado menos criativo ou nós que ficamos mais exigentes ou quem sabe chatos mesmo? acompanhe a jornada do Kolmeia e tentaremos responder essa pergunta.
Agora que a provocação foi feita para tentar encontrar respostas passaremos pelos mais recentes exemplos da falta de originalidade dos filmes, foco em franquias, influência dos algoritmos e uma análise sobre a subjetividade da criatividade. Já em alguns artigos derivados, abordaremos as mudanças na indústria cinematográfica, influência do público, tecnologias e efeitos especiais, economia e orçamento, cultura de franquias e remakes, criatividade na era digital.
Então, após toda essa viagem, possivelmente estaremos prontos para chegar a uma conclusão sobre o que pode estar acontecendo na indústria do cinema. Talvez apareçam ideias para revitalizar a criatividade e também entender o quanto mudamos enquanto público nos últimos anos e quem sabe, os espectadores possam apoiar e demandar filmes mais originais
Dito isso, vamos começar essa jornada agora mesmo.
Gigantes do Cinema e a Lançamentos reciclados nas Telas
Quando olhamos para a lista de filmes de 2024, nos deparamos com a seguinte lista:
Título | Gênero |
Meninas Malvadas | Comédia |
A Cor Púrpura | Drama |
Duna – Parte 2 | Ação, Aventura, Ficção Científica |
Kung Fu Panda 4 | Animação, Aventura, Comédia |
Ghostbusters – Apocalipse de Gelo | Ação, Comédia, Fantasia |
Godzilla e Kong – O Novo Império | Ação, Aventura |
Planeta dos Macacos – O Reinado | Ação, Aventura, Drama |
Furiosa: Uma Saga Mad Max | Ação, Aventura |
Divertida Mente 2 | Animação, Aventura, Comédia |
Um Lugar Silencioso: Dia Um | Terror, Suspense |
Meu malvado favorito 4 | Animação, Aventura, Comédia |
Deadpool e Wolverine | Ação, Aventura, Comédia |
Kraven – O Caçador | Ação, Aventura |
Beetlejuice 2 | Comédia, Fantasia |
Coringa – Folie à Deux | Drama, Crime, Suspense |
Gladiador 2 | Ação, Drama, História |
Mufasa – O Rei Leão | Animação, Aventura, Drama |
Venom 3 | Ação, Aventura |
Das 52 semanas disponíveis no ano, 18 delas terá a estreia de alguma continuação, prequel ou expansão de universo compartilhado, ou seja, durante quase um terço das estreias serão sobre filmes que o público já conhece minimamente a história. Ao analisar as reclamações que o preço do ingresso do cinema e gastos adicionais subiram nos últimos tempos, parece lógico a escolha dos estúdios em investir em histórias que o público já conhecem mais, como uma forma de evitar fracasso nas bilheterias, certo? Em tese, essa teoria funcionou bem até 2022, baseado na lista das maiores bilheterias da história do cinema e no conceito de que um filme é sucesso quanto ultrapassa a marca de 1 bilhão de dólares, a última sequência a atingir essa meta foi Jurassic World: Domínio. Além disso, em 2023 tivemos o evento Barbenheimer no qual Barbie e Oppenheimer estrearam no mesmo dia e por tratarem temas e público alvo tão opostos viraram sensação na internet.Afinal, por serem dois filmes com enredos originais, com diretores renomados e elenco de peso, isoladamente já tinham todos os predicados para chamar público, no entanto, graças às redes sociais o incentivo era que o público assistissem aos dois filmes.
O Público: Cansado do Já Visto
Junto do fenômeno Barbenheimer veio uma espécie de celebração de filmes originais, ou do cansaço da audiência precisar ter assistir outros filmes anteriores ou posteriormente para conseguir ir ao cinema para assistir um lançamento. Paralelo a isso, filmes de universo compartilhado como Homem Formiga: Quantumania foram mal de bilheteria, crítica e ainda recebeu uma enxurrada de reclamação dos fãs. E sem contar o caso da Missão Impossível: Acerto de Contas parte 1 – “fracassou” de uma forma retumbante nas bilheterias, mesmo tendo um enredo espetacular, simplesmente por ter apostado tanto numa data próxima ao evento Barbienheimer, quanto pelo acordo do Christopher Nolan com as salas de Imax.
De volta a 2024, parece que Hollywood ainda não entendeu o recado de 2023 e isso tem impactado diretamente as bilheterias. Para se ter uma ideia, Duna: Parte 2, apesar de ter sido um sucesso de crítica, público e ter recebido um sinal verde para uma possível parte 3, não superou a marca de 1 bilhão de dólares. Não iremos cometer o pecado de chamar a obra de Denis Villeneuve de fracasso comercial, no entanto, perto da bilheteria de Jurassic World: Domínio, talvez Duna venceria de braçada, mesmo estreando em fevereiro. Já Furiosa – Uma Saga Mad Max, teve uma estreia frustrante, para se ter uma ideia, apesar do incrível sucesso de Mad Max – Estrada da Fúria em 2015, o spin-off teve uma bilheteria de abertura inferior a filmes como Morbius, o que é literalmente trágico. Logo, a partir do caso de Furiosa, que apesar de ser uma personagem que já entrou para cultura pop, ficamos com a impressão de que a ideia sobre um filme de origem do personagem, soou como artifício barato para gerar lucro pode ter sido um dos fatores para essa recepção tão baixa.
Algoritmos: Criatividade em Hollywood Engessada por Dados
Outro ponto que colabora para esse cenário pode ser reflexo de uma utilização excessiva do uso de algoritmos para tomada de decisões. E antes que tirem conclusões precipitadas, esse artigo não irá demonizar o uso dos algoritmos, dados ou IA, no entanto, tudo em excesso acaba sendo prejudicial. Por exemplo, em meio a pandemia, de acordo com o portal Olhar digital, a Warner assinou assinou um contrato com a Cinelytic, empresa que desenvolveu uma Inteligência Artificial capaz “prever” o sucesso de um filme, coincidentemente ou não, de 2020 até o presente momento o estúdio vem passando por alguns problemas tanto de crítica, quanto de bilheteria. Sem contar, que numa jogada ousada, o estúdio também decidiu durante um tempo fazer estreias simultâneas no cinemas, que estavam reabrindo as salas com diversas restrições graças ao covid-19, e no seu serviço de streaming o que gerou uma reação negativa das cadeias de cinemas.
Voltando para tópico desse parágrafo, como ainda não está claro de que forma os algoritmos trabalham, e o principal, qual a origem dos dados e no que os mesmos se baseiam, o resultado final pode ser um grande problema, uma vez que esse processo pode limitar a descoberta de novos filmes e ideias originais, dificultando o sucesso de produções fora do mainstream. Além disso, pensando no cenário de filmes já produzidos e disponibilizados, os algoritmos já presentes nos streaming podem criar a sensação de looping, ainda seja, qualquer filme que não tenha compatibilidade com seus gostos podem sumir do radar o que aumenta a sensação que de você está assistindo mais do mesmo.
E o Futuro?
O futuro do cinema é incerto. Resta saber se a indústria conseguirá se adaptar às novas demandas do público e abraçar a criatividade, ou se continuará presa em fórmulas repetitivas e pasteurizadas. A jornada para desvendar esse mistério continua, e esperamos que, no fim, encontremos um cinema que nos emocione, nos inspire e nos faça refletir sobre o mundo e sobre nós mesmos.