O 100° texto do Kolmeia faz um convite para uma intensa reflexão sobre o futuro da sétima arte
Mesmo com o afrouxamento das medidas de isolamento para minimizar os efeitos da pandemia de coronavírus, a ida às salas de cinema ainda parece uma realidade distante. Afinal, um ambiente fechado com uma grande aglomeração de pessoas é o tipo de situação que as autoridades pedem para evitar. Dessa forma, é apresentada aos cinéfilos uma importante mudança de comportamento e consumo das artes cinematográficas que já vem sendo estabelecido, mas que deve ser potencializado no mundo pós-covid.
Primeiramente, para atender a essa transformação no paradigma da indústria, muitas estreias que ocorreriam em salas de cinema terão um destino diferente. Produções muito esperadas por fãs estão sendo transferidas para plataformas de streaming como, por exemplo, Netflix, HBO Go, Amazon Prime, entre outros. Consequentemente, qual a diferença para o cinema como arte e quais possibilidades para os admiradores mais ortodoxos?
Nesse contexto, é preciso compreender, no primeiro momento, que o que antes começou com os irmãos Lumière hoje se transformou em uma enorme indústria que emprega uma quantidade absurda de pessoas. Portanto, envolve dinheiro em quantidades exorbitantes. Dessa maneira, dentro da dinâmica de poder assistir quando e onde puder, mas que também o que quiser – não apenas o que está em cartaz em salas que priorizam os grandes lançamentos comerciais – como definir o que é arte?
Salas comerciais X oportunidades de novidades artísticas
De acordo com o Doutor em Filosofia pela Uerj e professor do Curso de Filosofia e Arte, Luame Cerqueira, devemos analisar dois aspectos distintos.
“Em relação ao aspecto artístico, não vejo diferença entre filmes de cinema e de streaming, há filmes bons e filmes ruins. Inclusive, o cinema enquanto arte, está cada vez mais distante das salas de cinema. Há cada vez menos espaço para experimentações que fujam do clichê. O streaming, apesar de estar abarrotado de filmes e séries de nenhum valor artístico, parece que tem mais espaço, até pelo formato, para permitir a entrada de grandes cineastas. Não à toa David Lynch ficou anos sem filmar por não ter espaço nas salas de cinema e conseguiu prosseguir com a arte graças a uma plataforma streaming, o que ele classifica como novo cinema de arte”, afirma o especialista.
O professor também recorda que essa mesma preocupação apareceu quando os cinemas de rua começaram a desaparecer, migrando para os shoppings: “sendo que esse era um falso problema, pois a questão principal é que os cinemas de rua já estavam virando cinemas de shoppings, no sentido de uma programação cada vez mais comercial”, esclarece. Ele ainda cita que o que será decisivo é se o filme é ou não potente. Caso seja, segundo ele, poderá ser exibido em qualquer mídia, seja sala de shopping ou Netflix.
Tempo de filme e como consumir
No entanto, há outro aspecto que precisa ser levado em consideração ao pensar o consumo do audiovisual neste século e, mais precisamente, durante a pandemia: a hiperconexão. Ou seja, a falta de capacidade dos indivíduos de se desconectar sem interrupções para se dedicar totalmente ao filme.
“Em casa, em nome do conforto ou de outras tarefas a fazer, as pessoas pausam seus filmes, atendem chamadas e assistem por parcelas que podem demorar dias. Esse corpo fragmentado tem cada vez mais dificuldade de se entregar às intensidades de um verdadeiro encontro: seja um grande filme ou uma conversa”, reflete Luame Cerqueira.
Em conclusão, é um chamado à mudança de hábitos e apreciação da arte, conexão com a narrativa e com as histórias ali contadas, independente da plataforma. Em suma, a experiência é muito menos enriquecida pelo nosso próprio comportamento diante da tela do que do tamanho dela ou do lugar no qual estamos apreciando.
E você? O que espera para o futuro do cinema? Comenta com a gente, afinal, sua opinião importa para o Kolmeia. Leia também: Uma curadoria não tão popular: Além dos filmes de heróis – Parte 1 . Até a próxima!