O filme Guerra Civil, dirigido por Alex Garland, estreou nos cinemas brasileiros na última quinta-feira (18). O longa-metragem se passa em um cenário distópico nos Estados Unidos tomado por uma guerra civil que, embora os motivos não estejam em evidência, é extremamente aterrorizante.
A história acompanha a fotojornalista Lee Smith (Kirsten Dunst), o repórter Joel (Wagner Moura), a fotógrafa iniciante Jessie (Cailee Spaeny) e o jornalista veterano Sammy (Stephen McKinley Henderson). Eles precisam cruzar o país para entrevistar o presidente (Nick Offerman), antes que o mesmo seja tirado do poder.
O filme é um road movie tradicional, no entanto, o que mais chama a atenção são as escolhas narrativas e estéticas de Alex Garland ao propor um filme que parece ser um documentário.
A história é tão crível que, por vezes, foi difícil desassociar aquelas imagens de um futuro próximo, uma hostilidade sem precedentes causada pela polarização de um país.
O diretor não entrega o motivo daquela barbárie, justamente por ser irrelevante se comparado ao tamanho de toda a destruição que permeia os Estados Unidos. Garland disse em entrevistas que sua proposta enquanto autor era fazer um filme sem escolher um lado.
Essa declaração se deve principalmente ao fato de ser ano de eleições estadunidenses, mas em uma cena específica é nítida a crítica ao nacionalismo exacerbado que reflete nos personagens de uma forma brutal.
Mesmo sem pretensões, portanto, o diretor esbarra em filme que possui uma enorme carga política que, dada a proporção do cenário, era inevitável.
O fotojornalismo é um personagem em Guerra Civil
O filme me lembrou um pouco o documentário vencedor do Oscar, 20 Dias em Mariupol, que acompanha um fotojornalista registrando o início da invasão russa à Ucrânia. Essa lembrança não é por acaso, este é o filme mais sóbrio de Alex Garland, conhecido principalmente por ficções científicas como Ex_Machina: Instinto Artificial e Aniquilação. Esses dois filmes, em específico, buscam instigar reflexões acerca do questionamento da realidade.
Em Guerra Civil, a reflexão é muito mais em torno do terror de uma realidade que está prestes a colapsar por causa da própria sociedade. O papel do jornalismo na história, no entanto, atravessa a narrativa para discutir até que ponto o registro de imagens ferem a humanidade de quem as compõem.
Nesse aspecto, é importante distanciar Kirsten Dunst da personagem angelical Mary Jane Watson, que brilhou na franquia do Homem-Aranha do Sam Raimi. Em Guerra Civil, a atriz dá vida a uma renomada fotojornalista que não vê problema algum em caminhar sobre corpos para conseguir a imagem ideal.
E não, não se trata da banalização da guerra. Pelo contrário, é o retrato de alguém que já vivenciou muitas coisas, independente do lado em que precisou empunhar sua câmera. E mesmo tendo presenciado tantas atrocidades, ela entende bem o seu papel naquele contexto. O clique não é prazeroso, o clique é necessário.
Um bom elenco potencializa a experiência
O filme trata-se da maior produção da A24, são 50 milhões de dólares que estão investidos principalmente em efeitos especiais. São intervenções sutis que muitas vezes passam despercebidas e isso engrandece, principalmente, a atuação do elenco que certamente faz toda a diferença para a história.
Um destaque especial para Wagner Moura, ator brasileiro que vive o Joel, repórter que sente prazer na adrenalina do jornalismo de guerra. O ator entrega diferentes camadas ao personagem e é extremamente importante para a condução dessa jornada do começo ao fim.
O personagem vivido por Moura representa os impactos da exposição aos riscos que essa profissão causa e como isso pode afetar o discernimento de alguém.
Cailee Spaeny tem o papel de interpretar a personagem que é a visão do espectador naquele cenário, ela está começando a entender os horrores da guerra e vê em Lee (Kirsten Dunst) uma referência a ser seguida.
Kirsten Dunst é a frieza desse grupo, sua personagem, Lee Smith, é extremamente profissional e está disposta a vivenciar o que for preciso para alcançar o seu objetivo.
Trata-se de uma atuação contida, mas igualmente complexa. A impressão é de que a personagem já perdeu o seu brilho e, por ter um olhar vazio, prefere enxergar o mundo através das lentes de sua câmera.
Guerra Civil é um filme que certamente vai gerar muitas discussões. A polarização, como existe no Brasil, pode ter consequências extremas dentro de uma sociedade.
Independente do motivo, o que o filme de Alex Garland mostra, são os efeitos que o conflito de interesses pode trazer até mesmo em quem só tem como papel registrar. Dentro desses parâmetros, é um filme extremamente competente no que se propõe e, portanto, merece muito ser visto.