Não havia dúvidas de que Falcão e o Soldado Invernal seria uma obra excelente. Inclusive, o Kolmeia fez sua análise em Falcão e o Soldado invernal | O que esperar dos próximos capítulos? Mas, por incrível que pareça, a série conseguiu ser melhor do que se esperava. A Jornada de Sam Wilson e Bucky Barnes, além de ser super dinâmica, ainda traz questionamentos interessantíssimos sobre política, sociedade, heroísmo e sobre conceitos como certo e errado e o bem e o mal. Dessa forma, até mesmo a própria ideia do que significa ser o Capitão América esteve em debate. Tudo isso sem perder a cara da Marvel que amamos.
Uma série sobre o valor dos Símbolos
Sem dúvidas, um dos temas centrais de Falcão e o Soldado Invernal é o valor por detrás dos símbolos, em especial dos heróis. A saber, um super soldado, embora tenha super força e habilidades, não é invulnerável. Em um mundo com tecnologia bélica super avançada, o valor de um humano com super força está mais no que ele representa do que na capacidade de ganhar uma guerra. Ainda mais em se tratando do Capitão América. Desde seu nome até seu escudo, suas roupas, suas características físicas, tudo nele quer dizer alguma coisa.
De Sam Wilson, a Karli Morgenthau, houve quem comentasse sobre simbologia. Mas, se pra Karli os símbolos representam um risco, para Sam: “Símbolos não são nada sem as mulheres e homens que dão a eles significado“.
Não é sobre ser Capitão…
No início dos anos 40, Steve Rogers ainda era um jovem idealista. A saber, o mundo passava por uma uma fase nefasta e o mal tinha uma forma bem definida: o nazi-fascismo. Nesse contexto, o jovem Steve via na guerra a única maneira de deter o mal. Precisava, então, se aliar ao bem, ou seja, o Exército Americano. Como, não havia possibilidade de diplomacia com nazistas, tornar-se um soldado e futuramente um capitão era extremamente necessário. Assim, surgia o Capitão América.
Hoje, a situação é diferente. A necessidade de guerras é cada vez mais questionável, diante de todas as vidas inocentes que se perdem. Além do mais, poucas vezes se conhece a real intenção por detrás de uma guerra e quem lucra com isso. Nesse contexto, é Sam que surge como exemplo de alguém que faz até a última tentativa de solucionar um conflito diplomaticamente,. O Falcão trabalhou aconselhando ex-combatentes vítimas de transtornos pós-traumáticos e, com isso, aprendeu a enxergar o humano por detrás da batalha e da patente. Certamente, o fator humano dentro do traje é o mais importante.
Nem sobre ser América!
A princípio, embora América designe um continente inteiro, os estadunidenses se apropriaram do Termo. Então, o Capitão América é, na verdade, Capitão Estados Unidos. Entretanto, a intenção não é problematizar o nome do personagem. Os apátridas na série reivindicam justamente a abolição das fronteiras. Assim sendo, se não tem fronteira, não tem Estados Unidos, nem necessidade de um símbolo que o represente. Porém, desconsiderando a proposta dos apátridas, ainda é possível questionar: quando se representa o Estados Unidos, se representa exatamente o quê? O governo? A população? Um conjuntos de tradições e valores culturais? A segurança nacional?
Em Guerra Civil, Steve Rogers rompeu com o Governo Americano ao se recusar a assinar o Tratado de Sokovia. Com isso, abdicou de seu escudo e seu título e tornou-se foragido até a necessidade de enfrentar Thanos. Assim sendo, ser inteiramente submisso ao Governo não é um requisito que Steve tenha visto em Sam, até porque Sam também não o foi.
Já, quando se fala sobre representar a população, isso inclui os negros, mulheres, imigrantes ou apenas o nato-americano padrão? Como encontrar um ponto de identificação para uma população tão diversa e cada vez mais consciente dessa diversidade? Só o território de nascimento não basta. Talvez fosse necessário novamente um inimigo em comum e inquestionavelmente malvado. Mas, olhando pra realidade, ignorar a diversidade e as novas demandas sociais em nome de ressuscitar uma suposta ameaça comunista, por exemplo, tornou o país ainda mais dividido.
Sobre os valores americanos, quais exatamente devem ser representados? O Protestantismo? Talvez Capitalismo? Ou quem sabe o Livre Mercado? E as Mazelas que ainda existem na sociedade, como o racismo e a xenofobia e outras que não são combatidas pelos valores anteriores? Mesmo em se tratando da Segurança nacional a série questiona: vele tudo na Guerra?
E se o Capitão América fosse Negro?
No final de Vingadores: Ultimato, quando Steve entregou o Escudo pra Sam muita gente se surpreendeu com a possibilidade de um Capitão América negro. Entretanto, essa possibilidade já foi real nos quadrinhos e agora também no MCU. No segundo capítulo de Falcão e o Soldado Invernal somos apresentados a outro super soldado. Isaiah Bradley tem uma história recheada de significados e, sem dúvidas, merece uma publicação só para ele. Afinal, ele foi o primeiro negro a assumir o manto do Capitão América nas HQs. Porém, o foco aqui será na história apresentada na série.
Diferentemente de Steve Rogers, Isaiah não virou um símbolo, nem foi condecorado. Ao contrário, sua existência foi escondida pelo Governo e ele ainda foi preso e transformado em cobaia humana pela CIA. Vale lembrar que isso ocorreu no período em que Steve estava congelado e tinha sido dado como morto. Certamente, era melhor não ter um Capitão América, do que ter um que fosse negro, ainda mais num contexto de apartheid. O próprio Isaiah deixa claro numa conversa com Bucky que nem a Hidra fez com ele a maldade que o Governo Americano foi capaz. E olha que ele derrotou o Soldado Invernal.
Em se tratando de Sam Wilson, parece que a situação é bem diferente, mas será? Ele sabe bem que, como negro, vai lidar com questões que um branco não entenderia. Quando um homem branco assume o escudo, ele é o Capitão América apenas. Mas, se um preto faz o mesmo, ele se torna “O Capitão América Negro”. Assim sendo, um cidadão americano preto pode olhar para um Capitão América branco e dizer “eu também sou América”. Enquanto um cidadão branco pode olhar para o “Capitão América Negro” e dizer “sou América, mas não sou negro”. O Falcão entende o peso do racismo.
A vez de John Walker, o novo Capitão América
Depois de tudo que se discutiu acima. Fica claro que antes de se saber quem vai ser o Capitão América, vem a questão sobre o que é ser o Capitão América e as implicações que o título traz. John Walker tem a patente necessária, a nacionalidade, o escudo, o soro. Entretanto, há características que pesam contra ele: ser legalista, pouco diplomático e ambicioso. Inclusive, a captura de Lemar foi só um pretexto para ele fazer o que já pretendia desde que pegou o soro. Ele se sentia humilhado por não ter a força e o prestígio de Rogers. Foi perceptível a humilhação que ele sentiu ao apanhar das Dora Milaje, por exemplo. Afinal, “elas nem tinham o soro do super soldado” (e eram mulheres) .
Ainda não é possível dizer que ele é exatamente um vilão malvado e incorrigível. Isso porque Falcão e o Soldado Invernal não nos deu informações suficientes para uma conclusão. Obviamente, matar alguém a sangue frio, com requinte de crueldade e sem chance de defesa é um indício muito forte de que ele é mal. Mas, por outro lado, o Novo Capitão América tem sintomas de estresse pós-traumático decorrente de guerra e que muitas vezes faz a pessoas viverem na lógica de “ter que eliminar o inimigo”. É caso parecido com John Kreese em Cobra Kai e Tenente Preston em Kong: Ilha da Caveira. Além disso, ainda existe o efeito recente do soro do super soldado e o trauma da morte de Lemar.
Outro agravante que pesa contra Walker é o fato de ter matado um inocente. Afinal, Karli agiu sozinha na explosão do prédio e na morte de Hoskins. O apátrida morto no máximo poderia responder por associação ao grupo. Não havia necessidade de pagar com a vida. Foi um erro grave, um crime filmado.
O Capitão América Necessário
O ataque de fúria de Walker e o crime cometido por ele resultaram uma das cenas mais impactantes do MCU: o escudo sujo de sangue. Num contexto em que a simbologia do escudo é posto em xeque, um escudo ensanguentado é, na verdade, uma América com as mão sujas de sangue. Diante disso, restam duas opções: destruir o escudo, como querem os apátridas, ou ressignificá-lo. Não é viável um mundo totalmente sem fronteira, Os EUA não vão deixar de existir. Então, uma vez que necessite de um símbolo, que seja um que relembre o passado, mas aponte para o futuro.
Tal qual o escudo, o título de Capitão América também é carregado de simbolismo. A pessoa que o carrega precisa da humanidade e do senso de justiça de Steve Rogers, que ia além de um dualismo moral de certos e errados. E que também entenda que há uma passado manchado para a partir dele se reconstruir. Já não é mais um símbolo novo, com uma imagem a ser construída do zero. Da mesma forma, não será mais ocupado por um menino ingênuo de vinte e poucos anos que pensa estar numa luta do bem contra o mal. Outra necessidade é contemplar a pluralidade e minimizar as injustiças cometidas em nome de haver um super soldado.
Diante de tantas exigências, apenas um nome se mostra eficiente para carregar esse título: Sam Wilson! O público (e Bucky também) já tinham certeza disso, desde que Steve entregou para ele o escudo. Mas o medo dele é compreensível, ainda mais depois de saber o destino de Isaiah. Entretanto, o super soldado negro injustiçado é mais um motivo para que Sam assuma o manto que lhe é de direito e honre Isaiah Bredlay, Steve Rogers e represente a América do Futuro!
Confira o trailer dos dois últimos episódios de Falcão e o Soldado Invernal
A Disney+ já divulgou o trailer dos dois últimos episódios de Falcão e o Soldado Invernal! Então, corre pra conferir!