Uma nova saga nacional acaba de sair quentinha do forno. Trata-se de “As Crônicas do Novo Mundo”, escrita por Giovana Khalil. Mais conhecida por seu nome artístico MissWalker, ela se destaca como produtora de conteúdo audiovisual, principalmente à frente do canal Plantão Geek. Agora teremos a oportunidade de conhecer o outro lado profissional dela com o lançamento do primeiro livro “O Vale da Morte”. A saga contará com seis volumes e promete nos transportar para um futuro distópico.
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*Texto escrito em parceria com @marcelosantana
Para você saber tudo sobre “O Vale da Morte” e “As Crônicas do Novo Mundo”, o Kolmeia conversou com a autora. Confira nossa entrevista:
Kolmeia: Na descrição de vários personagens, você menciona a relação com a fé. A construção dessa fé seria específica, relacionada a determinada religião ou mais geral, apenas no sentido de crer em algo?
MissWalker: Eu diria que ambas as formas são abordadas. Tanto no sentido da fé católica quanto no sentido da crença em algo que eles (os personagens) não podem controlar – como o futuro, por exemplo – sem necessariamente envolver religião alguma. Penso que, num universo apocalíptico, a abordagem de fé é muito importante para ditar objetivos e ações. Acreditar em alguma coisa mesmo sem saber no que exatamente. É muito perigoso para os personagens existir num mundo onde eles não sabem o porquê fazem parte daquela parcela que sobreviveu, com isso, eles devem se apoiar em alguma coisa. Seja acreditar uns nos outros, crer na esperança, ou simplesmente num ser superior. O literal conceito de fé é retratado como um tipo de bússola. Esses debates sociais estarão em peso no primeiro livro.
Kolmeia:”Como foi o seu processo de escrita? Houve muitas referências?”
MissWalker: Centenas, eu diria! (riso). Me apeguei muito em escritores e cineastas do gênero de terror e suspense, como Stephen King, Alfred Hitchcock, Edgar Allan Poe, Mary Shelley, Bram Stocker, George Romero, Robert Kirkman, H.P Lovecraft, William Peter Blatty, entre outros. Há também referências camufladas, como num easter-egg. Eu amo histórias com simbolismo, onde nada – literalmente, nada – é por um acaso. Então, eu aconselharia os leitores a prestarem atenção em números, sobrenomes, ou quaisquer referências artísticas presentes nas memórias dos personagens ou até mesmo na cena em si; fiz o meu melhor para que nenhum detalhe fosse em vão, abrindo margem para teorias do desenvolvimento da história enquanto o leitor está em seu processo de leitura.
Um de meus maiores desafios no processo da escrita foi a conciliação do tempo no qual os eventos principais da história acontecem. Há uma contagem de dias no primeiro livro, intitulada como A.C e D.C (Antes do Colapso e Depois do Colapso, respectivamente, uma pequena brincadeira com a nossa própria medição de tempo histórico) e durante a marcação de tempo, tive que calcular exatamente qual seria a duração das ações dos personagens, que, por vezes, sequer estariam no mesmo ambiente. Por exemplo, “Que horas seriam quando o personagem X fez a ação Y? E o que o personagem Z estaria fazendo nesse meio tempo?”
Fiz dezenas de esboços em papéis sobre essa contagem de tempo! Isso fez parte de praticamente todo o processo de escrita.
Kolmeia: “O que te levou a ambientar a sua história, que tem uma temática de fim do mundo, abordando um Apocalipse zumbi?”
MissWalker: Sempre fui apaixonada por distopias e histórias de sobrevivência. Amo abordagens com qualquer coisa que beira o surreal – como mortos que voltam a vida. Penso que, quando você apresenta uma situação inimaginável como essa para um grupo de seres humanos, eles vão ser obrigados a improvisar, e esse improviso pode custar a vida deles. A falta de conhecimento pode matar, num universo como esse. Gosto de como os personagens de tais histórias ficam sempre na beira do abismo, com conflitos mentais, questionando seus próprios valores e até onde iriam para proteger alguém que amam.
A ambientação no apocalipse zumbi faz isso. Apresenta o surrealismo e obriga os personagens (e o leitor!) a conviverem com o que não conhecem – o que torna o cenário ainda mais perigoso.
Kolmeia: “Você tem 6 protagonistas no livro. E possivelmente, mais 5 sequências depois de “O Vale da Morte”. Você pensou em dar destaque para cada personagem em um livro diferente ou foi só uma feliz coincidência?”
MissWalker: Apenas uma feliz coincidência! Posso dizer que ninguém está seguro nessa história. Apresentei seis personagens porque gosto de trabalhar dinâmicas entre duplas. Os pareios montados entre eles podem ditar se uma missão será fácil ou difícil, dependendo da convivência deles …acaba por se tornar um elemento de suspense também.
Kolmeia: “Que impacto social Você crê que a sua história tenha e qual a semelhança que isso pode ter com um futuro próximo da nossa realidade?”
MissWalker: Tentei fazer uma história que ultrapassasse o limite da sobrevivência em grupo. Com certeza o leitor entrará em contato com pautas que julgo serem importantes, como, por exemplo, os tratamentos para com a saúde mental, abordagens de ansiedade, depressão, luto, colapsos nervosos e como é importante respeitar suas próprias emoções – sendo elas tristes, raivosas ou felizes. É importante saber, acima de tudo, o que você está sentindo; e compreender também que as pessoas sentem as coisas de forma diferente e isso não te faz uma pessoa horrível.
Para abordar outras pautas, como representatividade LGBTQIA+ e diferentes etnias e culturas, fiz questão de conversar com pessoas que vivem essa realidade, pois eu sozinha jamais seria capaz de retratar de forma correta essa vivência por não ter experienciado nada daquilo. Então, ouvi histórias, relatos de experiências e tive conversas muito enriquecedoras que, com certeza, contribuíram bastante para a construção dramática de alguns personagens.
Houve também a abordagem político-social ao se falar do vírus e sua propagação, bem como a forma de contê-lo. Quais foram os estratagemas propostos para lidar com o problema e como um governo mal gerenciado pode afetar diretamente a vida da população – a ponto de muitos pagarem o preço com suas vidas. Uma realidade não tão fictícia.
Penso que todos os temas que citei acima são partes do nosso presente. É algo que sempre existiu, portanto, quanto mais falarmos sobre isso, maior será a conscientização. Isso nem o “Fim do Mundo” pôde mudar. Com o livro, talvez as pessoas possam refletir que a única diferença entre os seres humanos é se estão vivos ou mortos. O que nos separa é a nossa humanidade, nada mais.
Kolmeia: “A gente consegue perceber que na sua história, as pessoas não estão extintas. De alguma forma, muita gente consegue sobreviver. Tem a questão financeira sendo abordada… Você classificaria a sua história como um drama político ou uma romance ficcional?
MissWalker: A história gira em torno da sobrevivência, mas para isso, eles devem saber o porque chegaram no ponto de precisar sobreviver. É aí que entra o drama político.
Porém, apesar de tais dramas, a história com certeza é um romance ficcional. Durante a criação de personagens, como autora, chega a ser impossível não se basear em algo real, levando isso como uma referência. No meu caso, os protagonistas são baseados em partes de mim e de amigos muito próximos. Porém, por ter essa referência, não significa que deixa de ser uma ficção.
Kolmeia: Quem te acompanha há um tempo sabe o quanto você é fã de The Walking Dead (inclusive, daí vem o codinome MissWalker, certo?). Essa foi sua inspiração para a temática de zumbis? No que eles se diferem das outras obras sobre mortos-vivos?
MissWalker: Sim! O meu nome MissWalker utilizado na internet vem justamente do meu amor pela série e pelas histórias em quadrinhos The Walking Dead. “Walker” seria o nome do grupo de fãs dessa obra, enquanto “Miss”, remete a senhorita!
Com certeza, The Walking Dead teve uma participação importante durante a concepção da minha narrativa. Era o material de zumbis que eu mais tinha contato na época que comecei a escrever e é inegável as homenagens presentes no livro à saga do Robert Kirkman. Sempre fui fascinada pela construção de personagens dessa série!
Apesar dos zumbis de minha obra possuírem comportamentos semelhantes a saga de Kirkman, meus mortos-vivos possuem detalhes físicos diferentes sendo o maior deles a presença de olhos brancos.
Quis descreve-los assim para que houvesse uma alusão ao ditado “Os olhos são a janela da alma”. No momento que a infecção transforma a pessoa num zumbi, eles perdem essa alma. Quem eles eram antes é perdido para sempre, junto com todas as suas memórias e sonhos. É um destino pior do que a morte, se quer saber.
Kolmeia: O tempo em que a trama se passa é um futuro distópico, mas e quanto ao local? Onde se passa a história? E por que esse local foi escolhido?
MissWalker: Desde o princípio quis ter a liberdade criativa de criar meu próprio país e minhas próprias cidades, dessa forma não ficaria presa a nenhum detalhe ultra realista, como ter a responsabilidade de retratar a geografia, fauna e flora de um lugar que já existe. A história se passa num país chamado República de Northwinster, e a história começa na capital de mesmo nome. (Sim, o país se chama Republica de Northwinster enquanto o estado-capital se chama apenas Northwinster).
Kolmeia: Você pretende focar apenas no gênero de terror ou haverá no futuro outros gêneros que serão escritos?”
MissWalker: Com certeza haverão outros gêneros a serem escritos. Ideias é que não me faltam, com certeza! Tenho, até mesmo, alguns rascunhos prontos de sagas de fantasia-medieval, outras de aventura com piratas, bem como contos de suspense que quero transformar numa antologia. Até poemas eu escrevi!
Devo me atar nos gêneros de terror e de fantasia, por enquanto, mas nunca se sabe o dia de amanhã! (riso)
Kolmeia: Como profissional de audiovisual, você sempre arrasa nas análises de roteiro, vide os conteúdos quase sempre certeiros de Stranger Things. Nesse contexto, qual é a sua relação com a escrita? Por que ir pelo caminho da produção de livros? Será que um dia poderemos esperar uma série assinada por Giovana Khalil?
MissWalker: Seria meu sonho assinar uma série! Quem sabe exista uma série sobre as Crônicas do Novo Mundo no futuro? É só me chamar! (risos)
A escrita sempre foi meu refúgio, de todas as formas. Desde um poema, até um livro e eventualmente um roteiro.
Creio que fui pelo caminho dos livros porque sempre amei ler. Dou muito crédito desse hábito a meus pais que sempre traziam algo para que eu pudesse ler, nem que fossem gibis. Filha de professores como sou, a leitura sempre foi muito valorizada em casa. Quando cresci e conheci os roteiros, vi que uma história poderia ter diversas formas de ser contada e que haviam maneiras diferentes de coloca-las no papel.
Enquanto um roteiro é focado nas ações e não nos sentimentos, livros possuem de tudo. Ambos têm a sua magia. Ambos são difíceis de escrever. E ambos podem ser fantásticos à sua própria maneira. É o ato de contar uma história que me atrai.
Saber que uma história pode ser a fuga de alguém passando dificuldades, ou então o contato que ela tem com um mundo completamente novo, proporcionando uma liberdade sem sequer mover um músculo…é mágico. É essa capacidade que me fascina. Chega a ser surreal a capacidade dos livros de te transportarem para uma outra realidade, com outras pessoas, com elementos que você jamais imaginou! Eu queria ser parte disso. Gostaria de proporcionar isso para as pessoas, e é por isso que escolhi a escrita, e depois, o audiovisual.
Sobre minha escrita em si, eu diria que As Cronicas do Novo Mundo é o projeto mais pessoal e significativo da minha vida. Isso se deve ao momento que comecei a planejar essa história, que seria no ano de 2013. Naquela época, eu estava passando pelo momento mais difícil da minha vida psicologicamente falando, e…bem…nunca fui alguém muito aberta emocionalmente. Minha válvula de escape foi a escrita. Me parecia muito mais fácil transformar meus sentimentos em pessoas, ou criar personalidades novas numa história, que pudessem sentir o que eu estava sentindo. Foi a maneira que encontrei de colocar tudo pra fora. Acho que foi por isso que demorei tanto tempo para publicar o livro, porque sempre senti que a partir do momento que publicasse, eu me sentiria muito exposta.
Estou pronta pra isso agora.
K: Para finalizarmos, conta um pouquinho do seu processo criativo e deixa um recadinho pras pessoas que sonham em trabalhar com escrita.
MissWalker: Sobre meu próprio processo criativo, é loucura dizer que comecei minha história pelo final? (risos) Não me refiro ao final do primeiro livro, e sim ao final do último livro! Pra mim, isso caiu como uma luva pois desde o início eu tive um norte. Eu sei pra onde estou indo.
Meu maior gatilho criativo é um sistema de perguntas que aprendi criando roteiros em audiovisual. Eu sempre me pergunto o “porquê” de tudo! Porque essa cidade? Porque criei esse personagem? Porque essa pessoa foi infectada? Porque ela(e) deve morrer? Porque ela(e) deve sobreviver? Qual é mensagem por trás disso? Porque os personagens devem ir para o local X? E assim por diante.
Li, reeli, escrevi e reescrevi meu material diversas vezes. O prólogo do primeiro livro foi escrito oito vezes até que eu ficasse satisfeita. Sou muito perfeccionista com minha escrita, o que por vezes chegou a atrapalhar meu próprio processo. Levou um tempo para que eu me freasse e começasse a pensar “Pare de ficar olhando pra quantas páginas o seu livro vai dar! Escreva essa ideia, se estiver ruim, é só apagar!”.
Ainda lido com isso com frequência! (riso)
A concepção dos personagens foi minha parte preferida. A protagonista Carley é uma anti-heroína, o que significa que haverá momentos da história que vocês podem amá-la ou odiá-la. Personagens tridimensionais, como os presentes nessa história, requerem uma boa ficha biográfica e um bom estudo de narrativa psicológica, e isso por si só é bem desafiador. Tentei criar pessoas reais, com erros, defeitos e qualidades reais. Não há mocinhos ou vilões, há apenas pessoas, e creio que existe uma mensagem poderosa por trás disso se escrito corretamente, por isso demorei muito tempo para conceber como cada personagem seria, mas foi e ainda é uma jornada maravilhosa.
O recado que dou pras pessoas é bem simples: Não se force a escrever nada. Sei que é frustrante e que podem haver dias que surja uma decepção relacionada a não estar escrevendo o suficiente, mas não se apressa a criatividade. Se tudo que você conseguiu escrever em um dia foram 50 palavras, então já foi um progresso. Se não conseguir escrever nada, ainda sim é um progresso – mas este, você não pode ver. É melhor escrever algo que valerá a pena ler do que escrever por obrigação.
Aconselho sempre estar em contato com suas referências, para que isso gere gatilhos criativos. Escreve histórias de fantasia? Consuma fantasias! Leia muito, isso é importante! Gosta de triângulos amorosos? Consuma histórias que contém esse elemento narrativo! O seu estudo também é um progresso, por mais que não coloque ele no papel ainda.
Não se apegue a fórmulas, pois não há nenhuma.
Lembrando que, embora os livros da pré-venda tenham esgotado, novas unidades serão disponibilizadas ainda este mês na Amazon. Você poderá adquirir o seu clicando aqui. E, assim que possível, o Kolmeia disponibilizará uma resenha sem spoiler para vocês! Lembrando que há mais informações na página oficial da saga no Instagram em @cronicasdonovomundo